JOSENILDO SOUZA – Universidade na Mesorregião do Alto Solimões: a Amazônia em debate

Professor universitário e escritor, Josenildo Souza

Na Amazônia residem riquezas imensuráveis, seja do ponto de vista da biodiversidade dos recursos naturais, seja em relação à sociodiversidade dos seus territórios, etnias, saberes e diálogos, que se cruzam e intercruzam nas múltiplas relações de empreendimentos individuais e coletivos, como possibilidade sociotécnica, na perspectiva de Bruno Latour, sociólogo e filósofo francês, falecido em 2022.

A Amazônia será impotente, anuncia Luiz Carvalho, filósofo amazônida, professor aposentado da Universidade Federal do Amazonas, se continuar sendo negado às populações que nela habitam acesso ao conhecimento historicamente produzido, a elaboração em diálogo com os saberes tradicionais e o complexo ecossistema amazônico. Desde o início da segunda metade do século XX, quando Raquel Carson lançou o livro Primavera Silenciosa, em 1960, a Amazônia foi catapultada à centralidade do debate global, culminando com a Conferência de Estocolmo, em 1972.

De lá para cá, inúmeras conferências e protocolos globais, que constataram a necessidade de reverter os problemas ambientais e as consequências catastróficas, não saíram do papel, muito embora tenham recomendado cuidar do Nosso Futuro Comum. Os sintomas trazidos pelas crises, que se agravaram com a COVID-19, guerras (políticas, econômicas, religiosas, étnicas, cibernéticas e midiáticas), as queimadas naturais e criminosas, genocídio da população pela violência (negação de direitos, desigualdades sociais, garimpo ilegal, falta de serviços básicos de saúde, moradia, água potável, educação e oportunidade de emprego e renda), incidem em efeitos nas mudanças climáticas.

A Amazônia, a despeito de popularmente ser denominada de “pulmão do mundo”, “eldorado”, “paraíso verde”, sinônimo de “riquezas” naturais, é o território onde vivem as populações com os piores índices de qualidade de vida do Brasil, na pobreza e extrema pobreza, algo que, nos últimos seis anos, acentuou-se, segundo apontam dados do IBGE (2023). As populações mais afetadas, como não poderia deixar de ser, são as populações dos territórios tradicionais: indígenas, quilombolas, ribeirinhos e extrativistas. 

O Amazonas, maior estado brasileiro, possui apenas uma Universidade Federal. O Ensino Superior só chegou às populações do interior do estado em 2006, com a expansão do Ensino Superior, com a criação de quatro campi, nos municípios de Humaitá, Coari, Benjamin Constant e, posteriormente, em Parintins e Itacoatiara. Nos últimos anos, muitas vozes anunciaram um movimento em defesa da criação de mais universidades no Amazonas. As populações da mesorregião do Alto Solimões organizaram movimentos populares e audiências públicas cotejando a criação de uma universidade no município de Benjamin Constant. Quem sabe o novo PAC (2023), do governo federal, traga a universidade que tantos sonham!

A Zona Franca de Manaus, criada pelo Decreto nº 288, em 28 de fevereiro de 1967, previa, dentre outras finalidades, desenvolver a Amazônia. Significava também a necessidade de mais universidades públicas na região, como se pode vislumbrar no livro de Djalma Batista, O complexo da Amazônia. De outro modo, tal concretização perpassa pela efetiva aplicação do Decreto nº 6.008/2006, no interior do estado, com a criação de centros de pesquisas (ver livro O desenvolvimento sustentável na educação amazônica), o que a criação de novas universidades pode fomentar.

Entretanto, o arcabouço normativo precisa ser revisado para atrair e fixar pesquisadores em regiões remotas da Amazônia, como faz a Universidade Estadual do Amazonas (UEA). Professores e pesquisadores fora do centro de Manaus recebem gratificação salarial de localidade. Servidores federais, que atuam em região de fronteira, recebem gratificação salarial (forças armadas, justiça, por exemplo). No caso das universidades e institutos federais, o congresso nacional precisa legislar a regulamentação do artigo 7, inciso XXIII, da Constituição Federal de 1988, que trata de atividade penosa. Nesse caso, toda a sociedade brasileira é parte, se realmente a defesa da Amazônia importa. De igual modo, todos os ministérios do governo federal, autarquias (Suframa, Sudam) e instituições federais, devem ser direta ou indiretamente interessados em tal consecução.

* O autor é professor da UFAM e doutorando na Universidade Federal de Pelotas. É autor do livro ‘O Desenvolvimento Sustentável na Educação Amazônica: o uso do cinema na articulação de temas transversais de desenvolvimento sustentável no ensino fundamental do município de Parintins-Amazonas-Brasil”

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