ROBÉRIO BRAGA – O centenário da revolução

Transcorre, neste julho, o centenário da Revolução de 1924 no Amazonas, quando o tenentismo que já se animara em vários movimentos por outras partes do País, sem muito sucesso, aproveitou a crise econômica, política e institucional que se alastrava nas terras amazonenses e destituiu o governo constitucionalmente eleito, mas administrativamente falido, e salvou a população da oligarquia liderada por César do Rego Monteiro.

Robério Braga

Foi a 23 de julho de 1924 que o movimento militar se efetivou, levando grande parte da população manauense as ruas, recebendo a adesão inconteste de antigas e novas lideranças políticas e, como ficou propagado, redimindo e libertando o povo de um governo que, estabelecido em 1921, estava se desmilinguindo e enriquecendo a uns poucos e empobrecendo ainda mais os mais pobres.

A situação econômico-financeiro do Estado era precaríssima. A exportação de borracha, único produto regional que apresentou resultados satisfatórios na pauta nacional e teve expressiva repercussão local e permitiu a transformação urbana da capital, foi a mesma que facilitou esbanjamentos grandemente prejudiciais aos cofres públicos e a seringalistas e políticos de carreira, pois essa exportação estava em decréscimo acentuado e seguindo em direção à estagnação. Acima de tudo, aumentou o número de pobres e miseráveis no interior e na capital.

O governador Rego Monteiro, para atender necessidade de família, viajou ao exterior autorizado pelo Poder Legislativo, levando consigo o dobro de seus subsídios, na ordem de dez contos de réis, valor que era bastante expressivo para a época, e deixou a Administração nas mãos do genro, Turiano Meira, presidente da Assembleia, e de três filhos que eram o prefeito de Manaus, o chefe de Polícia e o secretário do gabinete do governador.

O cenário local era tenebroso: os funcionários estaduais precisavam pagar elevado ágio para receber salários atrasados em muitos meses; os comerciantes não recebiam o produto das vendas que prestavam; os amigos do poder, dentre eles Pedro Pinto de Mesquita e Antônio Augusto Lobato Faria permaneciam usufruindo de todas as benesses oficiais e explorando negócios e contratos nada recomendáveis.

Ao longo dos dias do governo da vitoriosa revolução surgiram inúmeras denúncias que comprovavam extorsão em relação a vários comerciantes, como a Caetano Monteiro da Silva, que sofreu redução de 90% dos créditos que tinha a receber do Tesouro, por carta de sentença contra a Fazenda do Estado em razão de procuração que foi obrigado a fazer em favor de Pedro Pinto de Mesquita; o que também sucedeu com Floro Osório Ferreira Pinto, com a professora Raimunda Frota Leite que foi obrigada a vender metade do seu salário para enviar o filho para estudar fora de Manaus; com o coronel Pedro José de Souza que se viu obrigado a vender 90% dos salários atrasados … além de inúmeros outros fatos desabonadores, no mínimo, propalados publicamente pelo desembargador Estevão de Sá, por Bonifácio de Almeida, Cunha Mello, Raimundo Nogueira, Coriolano Durand, Barros Corrêa (procurador da República), Gentil Ferreira, Santa Cruz Oliveira (procurador fiscal da Fazenda Nacional), e de denúncias em jornais do Rio de Janeiro e confirmadas por diversas testemunhas como os advogados Achiles Beviláqua, Augusto Pamplona, Francisco Gomes Malveira e o despachante Jesuíno Avelino.

Na boca do povo estavam os nomes dos mais audaciosos: Lobato de Faria despontava sem rival entre os maiores beneficiados pelos esquemas implantados e dentre os “negocistas” de então, o qual foi denunciado por inúmeras pessoas como o “chefe da quadrilha”, entre elas o respeitado escritor Benjamin Franklin de Araújo Lima.

Embora tenhamos alguns bons trabalhos acadêmicos em derredor do tema devidamente publicados, desde o pioneirismo da professora Eloína Monteiro, ainda há muito a investigar a respeito, e, desta feita, apenas lanço provocações e relembro o feito de salvamento do povo liderado por Alfredo Augusto Ribeiro Júnior.

*O autor é membro da Academia Amazonense de Letras, advogado e ex-secretário de Cultura do Amazonas 

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