ROBÉRIO BRAGA – Depois do tiroteio

 

Robério Braga

As últimas eleições municipais na capital amazonense, ao que pude acompanhar mesmo à distância, tiveram embates muito acirrados entre os principais candidatos ao cargo de Prefeito, transformando a disputa democrática quase em um tele ringue que atravessou os programas do horário eleitoral gratuito, chegou aos debates em televisão, porém, de forma ainda mais agressiva e até desproposital e desproporcional a esse tipo de campanha, invadiu o mundo das redes sociais que, para muitos, parece ser terra sem dono e sem lei. Deu-se um verdadeiro tiroteio em terra de muro baixo, como se dizia em tempos antigos.

Passado esse temporal, armado por interesse de uns e ao qual alguns tiveram de aderir e outros submergiram, procurando fugir ao fogo cruzado que se estabeleceu até com o uso dos chamados petardos perdidos (do tipo bala perdida), aqueles que acabam atingindo quem não está no campo da disputa, após tudo isso, se impõe que vencedores e vencidos se voltem para os verdadeiros interesses e necessidades da cidade e da população, porque, afinal, o que deve interessar é o bem-estar de todos e o desenvolvimento (verdadeiro desenvolvimento) do Estado e de nossa capital que é, agora, o objeto imediato desse modesto artigo de canto de página.

No fundo, no fundo, creio que todos os envolvidos, ou pelo menos a maioria deles, tem a noção exata das necessidades que nos afligem enquanto cidadãos assim como no que diz respeito ao sítio urbano em que residimos e trabalhamos, com grande parte da população impedida de usufruir das mínimas condições adequadas de vida, furtados que têm sido os próprios direitos de cidadania. Não precisa ir muito longe para constatar essa dura realidade a qual, aliás, vinha ficando distante dos olhos de boa parte dos moradores e, nos últimos anos, está batendo à porta de todos, seja pela desordem urbana, pelo sistema viário precário, pelo transporte coletivo ineficiente, pela insuficiência da arborização e ajardinamento, pela insegurança que se espalha por todos os recantos, pela alta de praças e parques públicos, pela falta de energia e de esgoto, pela necessidade cada vez maior de oportunidade de trabalho… e por aí seguiríamos com um sem-número de questões, algumas das quais chegam a ferir a dignidade da pessoa humana.

Calamitoso é o estado do Centro Histórico que poderia ser transformado em atração de boa valia para o turismo, para moradias de qualidade e de interesse real para a defesa do patrimônio histórico edificado, o qual, apesar de alguns esforços nesse sentido, segue sendo dilacerado e sendo ainda mais escarnecido. Ouso dizer que a formação de polos de boa atração ou módulos como o original do Largo de São Sebastião e as ações iniciadas nas praças da Polícia e do Congresso é que poderiam responder de forma mais positiva e com alguma presteza ao propósito de reabilitar o Centro da condição deplorável em que se encontra.

Em todas as cidades que se prezam e aspiram movimento turístico, as ações e equipamentos de cultura, a limpeza, iluminação, calcetamento das vias, calçadas, sinalização, segurança, hotelaria, casas de gastronomia… preferem e são feitos para valorizar os centros históricos e estes se tornam importantes, bem valiosos, e o poder público e a iniciativa privada caminham juntos para que seja possível criar as condições adequadas a essa característica urbana. Ações isoladas, estanques, ainda que positivas, acabam se perdendo se a vizinhança continuar apodrecida.

Creio que é chegada a hora (já até passamos) para a composição de um grande mutirão de planejamento sério e trabalho conjunto, com uma única meta, qual seja a de todos assumirmos que, depois do tiroteio, vamos cuidar de Manaus. De minha parte, sem qualquer interesse outro e de qualquer natureza, mormente como cidadão manauense, estendo a mão para contribuir com essa iniciativa.

*O autor é advogado e membro da Academia Amazonense de Letras*

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